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Audiência de Custódia e o PL 470 de 2015


As Entidades Integradas (Adepol e Sindepo) vêm trabalhando intensamente com a ADPF, perante o MJ e CNJ na busca pelo aprimoramento do projeto que o Conselho Nacional de Justiça irá implementar na justiça brasileira, que visa estabelecer a audiência de custódia do preso em flagrante.
Dentro desse diapasão, é buscado o diálogo para que a medida – que efetivamente será implantada pelo CNJ – não traga prejuízo às nossas atividades, mas, pelo contrário, possa trazer eficácia ao sistema em benefício da sociedade.

Nesse sentido e considerando que a decisão já foi tomada pelo CNJ, o Deputado Laerte Bessa apresentou o PL 470 de 2015 (texto abaixo), na busca de trazer eficácia às atividades de polícia judiciária.

PROJETO DE LEI Nº 470, DE 2015.

(Do Sr. Laerte Bessa)

Altera o Código de Processo Penal para estabelecer a audiência de custódia, e dá outras providências.

O CONGRESSO NACIONAL decreta:

Art. 1º Os arts. 304, 306, 310 e 322 do Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941 – Código de Processo Penal, passam a vigorar com as seguintes alterações:

“Art. 304……………………………………………………………………………………

………………………………………………………………………………………………..

  • 1o Resultando das respostas fundada a suspeita contra o conduzido, a autoridade mandará recolhê-lo à prisão, exceto no caso de livrar-se solto, de aplicação de medida cautelar diversa da prisão ou de manifesta causa excludente de ilicitude prevista no art. 23 do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, e prosseguirá nos atos do inquérito ou processo, se para isso for competente; se não o for, enviará os autos à autoridade que o seja. (NR)
    …………………………………………………………………………………………………..

…………………………………………………………………………………………………..

  • 4º O preso tem o direito de ser assistido por advogado, público ou contratado, durante o seu interrogatório policial, podendo ser nomeado defensor dativo pelo delegado de polícia, com a concordância do interrogando, se este não o dispensar expressamente ou permanecer em silêncio, no exercício da autodefesa. (NR)
  • 5º Todo preso será submetido a exame de corpo de delito cautelar, realizado por perito-médico oficial, onde houver, ou médico nomeado pelo delegado de polícia, preferencialmente entre os integrantes da rede pública de saúde.” (NR)
    “Art. 306……………………………………………………………………………………..

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  • 3º A comunicação da prisão será acompanhada do laudo preliminar do exame de corpo de delito cautelar do preso. (NR)
  • 4º O preso não poderá permanecer em delegacia ou unidade da polícia judiciária por prazo superior a 72 horas, devendo ser transferido para setor específico de custódia, triagem e transição de presos ou para estabelecimento penitenciário, à disposição do juiz. (NR)
    “Art. 310……………………………………………………………………………………..

…………………………………………………………………………………………………..

  • 2º No prazo de 24 horas, após o recebimento do auto de prisão em flagrante, o juiz poderá designar audiência de custódia, que será realizada com a participação da defesa e do Ministério Público, caso o indiciado tenha sido interrogado sem defensor ou não tenha sido posto liberdade pelo delegado de polícia, mediante fiança ou outra medida cautelar diversa da prisão. (NR)
  • 3º A audiência de custódia terá por objetivo as providências elencadas no caput e poderá ser realizada por videoconferência.” (NR)
    “Art. 322 No caso de prisão em flagrante, o delegado de polícia poderá colocar o indiciado em liberdade aplicando, em decisão fundamentada, isolada ou cumulativamente, as medidas cautelares diversas da prisão previstas nos incisos I, II, III, IV, V, VIII e IX do art. 319, nas seguintes hipóteses:

I – crimes culposos;

II – crimes dolosos punidos com pena de detenção;

III – crimes dolosos punidos com pena de reclusão não superior a quatro anos;

IV – quanto não estiverem presentes os requisitos da prisão preventiva. (NR)

Parágrafo único. O delegado de polícia comunicará o juiz competente nos termos do art. 306, que decidirá, na forma do art. 310, sobre o auto de prisão em flagrante e as medidas cautelares eventualmente aplicadas.” (NR)

Art. 2º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

JUSTIFICAÇÃO

Muito se tem falado sobre audiência de custódia, alguns antevendo na medida a solução para o elevado número de presos provisórios e o fim de todas as formas de violações aos direitos dos presos.

Por essa razão, importante notar que não existe uma suposta imprescindibilidade de apresentação de todos os presos em flagrante exclusivamente ao juiz de direito.

O Brasil é signatário do Pacto Internacional Sobre Direitos Civis e Políticos, da Organização das Nações Unidas, cujo item 03 do art. 09 dispõe da seguinte forma, verbis:

ARTIGO 9

“3. Qualquer pessoa presa ou encarcerada em virtude de infração penal deverá ser conduzida, sem demora, à presença do juiz ou de outra autoridade habilitada por lei a exercer funções judiciais e terá o direito de ser julgada em prazo razoável ou de ser posta em liberdade. A prisão preventiva de pessoas que aguardam julgamento não deverá constituir a regra geral, mas a soltura poderá estar condicionada a garantias que assegurem o comparecimento da pessoa em questão à audiência, a todos os atos do processo e, se necessário for, para a execução da sentença.” Grifamos.

A Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica) dispõe de forma semelhante no item 05 do art. 07, vejamos:

ARTIGO 7

“5. Toda pessoa detida ou retira deve ser conduzida, sem demora, à presença de um juiz ou outra autoridade autorizada pela lei a exercer funções judiciais e tem direito

[…] a ser posta em liberdade, sem prejuízo de que prossiga o processo. Sua liberdade pode ser condicionada a garantias que assegurem o seu comparecimento em juízo.” Grifamos.
Esses dispositivos são corroborados pela Resolução nº 43/73, da Assembleia Geral, de 9 de dezembro de 1988, da Organização das Nações Unidas, traz o “Conjunto de Princípios para a Proteção de Todas as Pessoas Sujeitas a Qualquer Forma de Detenção ou Prisão”, dentre os quais se destacam os seguintes:

PRINCÍPIO 4

“As formas de detenção ou prisão e as medidas que afetem os direitos do homem, da pessoa sujeita a qualquer forma de detenção ou prisão devem ser decididas por uma autoridade judiciária ou outra autoridade, ou estar sujeitas a sua efetiva fiscalização.” Grifamos.

PRINCÍPIO 37

“A pessoa detida pela prática de uma infração penal deve ser presente auma autoridade judiciária ou outra autoridade prevista por lei, prontamente após sua captura.Essa autoridade decidirá sem demora da legalidade e necessidade da detenção […]”. Grifamos.

Da simples leitura dos dispositivos depreende-se que o detido deve ser conduzido sem demora à presença de um juiz ououtra autoridade autorizada por lei a exercer funções judiciais.

Para que não reste dúvida, a Resolução nº 43/73 da ONU traz o conceito da expressão outra autoridade como “outra autoridade estabelecida nos termos da lei cujo estatuto e mandato ofereçam as mais sólidas garantias de competência, imparcialidade e independência”.

Analisando esse conceito sob a ótica do ordenamento jurídico interno, percebe-se que a lei maior da República instituiu o cargo de delegado de polícia como dirigente das Polícias Civis, sendo, portanto, o titular das funções de polícia judiciária e de apuração de infrações penais, nos termos do no §4º do art. 144, da Constituição Federal.

Nesse sentido, quando restringe determinado ato à reserva de jurisdição, a Constituição Federal o faz claramente, como no inciso LXI do art. 5º, ao dispor que ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente.

A análise da legalidade da prisão em flagrante delito, portanto, não está sujeita à reserva de jurisdição.

Corroborando esse entendimento, o inciso LXII do art. 5º da Carta Magna estabelece que “a prisão de qualquer pessoa e o local onde se encontre serão comunicadosimediatamente ao juiz competente e à família do preso ou à pessoa por ele indicada”, não impondo, pois a apresentação imediata do preso ao juiz, que deve ser comunicadoimediatamente.

Da mesma forma, o inciso LXIV do art. 5º da Constituição dispõe que “o preso tem direito à identificação dos responsáveis por sua prisão ou por seu interrogatório policial”.

Percebe-se que a Constituição Federal serve ao mesmo tempo de autorização constitucionalpara que o delegado de polícia seja o primeiro a decidir sobre a prisão e garantiado preso para que tenha ciência sobre a identidade de quem o prendeu e da autoridade de polícia judiciária responsável pela análise da legalidade do ato que restringiusua liberdade.

Portanto, o delegado de polícia é a autoridade autorizada pela Constituição Federal e por diversas leis federais a exercer atipicamente funções judiciais, mesmo não integrando o Poder Judiciário, o fazendo, por exemplo, quando arbitra fiança como condição para concessão da liberdade do preso em flagrante, quando apreende um bem relacionado ao crime, quando homologa a prisão em flagrante e determina o recolhimento do conduzido à prisão ou quando promove o indiciamento, ato que se reveste das mesmas formalidades das decisões judiciais, nos termos do § 6º, do art. 2º, da Lei Federal nº 12.830, de 20 de junho de 2013,verbis:

“O indiciamento, privativo do delegado de polícia, dar-se-á por ato fundamentado, mediante análise técnico-jurídica do fato, que deverá indicar a autoria, materialidade e suas circunstâncias”.

Podemos citar diversos outros dispositivos legais que habilitam o delegado de polícia a exercer tais funções. Basta notar que o ingresso no cargo de delegado de polícia federal possui requisitos semelhantes aos exigidos pela Constituição Federal1 para ingresso na magistratura, nos termos da Lei nº 9.266/96 2, alterada pela Lei nº 13.047/2014.

1 CF. Art. 93…. “ I – ingresso na carreira, cujo cargo inicial será o de juiz substituto, mediante concurso público de provas e títulos, com a participação da Ordem dos Advogados do Brasil em todas as fases, exigindo-se do bacharel em direito, no mínimo, três anos de atividade jurídica e obedecendo-se, nas nomeações, à ordem de classificação”.

2 Art. 2o-B. O ingresso no cargo de Delegado de Polícia Federal, realizado mediante concurso público de provas e títulos, com a participação da Ordem dos Advogados do Brasil, é privativo de bacharel em Direito e exige 3 (três) anos de atividade jurídica ou policial, comprovados no ato de posse.

A Lei Federal nº 12.830/2013, por sua vez, estabelece regras que garantem a autonomia do delegado de polícia em sua atividade, tais como a exigência de despacho fundamentado com base no interesse público ou descumprimento de normas regulamentares para que o inquérito possa ser avocado (art. 2º, §4º); a necessidade de fundamentação para que o delegado possa ser removido de sua lotação (art. 2º, §5º); a previsão de que o indiciamento é ato privativo do delegado de polícia (art. 2º, §6º); além de lhe ser deferido o mesmo tratamento protocolar dispensado a magistrados, promotores e advogados (art. 2º, §7º).

A interpretação lógica, sistemática e teleológica dos dispositivos analisados nos permite concluir que as funções exercidas pelo delegado de polícia encontram não só amparo, mas verdadeira previsão no Pacto Internacional Sobre Direitos Civis e Políticos e na Convenção Americana de Direitos Humanos.

Por essas razões, é possível concluir que o delegado de polícia é, ao lado do juiz, a autoridade habilitada por lei a tomar conhecimento da prisão e decidir sobre sua legalidade.

Quanto à análise da conveniência de se instituir a audiência de custódia em que o preso deve ser apresentado ao juiz e não ao delegado de polícia, existe a fundada dúvida da necessidade de se conduzir todosos presos indistintamente à presença do juiz.

Certamente é mais racional, lógico e menos oneroso em vários sentidos ampliar as possibilidades de o delegado de polícia conceder fiança e até mesmo aplicar algumas medidas cautelares não sujeitas à reserva de jurisdição, logo após a prisão em flagrante, reservando a audiência de custódia para os casos de autuados por crimes mais graves que permanecerem presos.

A par disso, existem sérias preocupações com relação ao sistema acusatório.

Em função do princípio acusatório, é necessário um distanciamento seguro entre o julgador e os fatos incipientes da investigação, pois meras conjecturas iniciais não contrastadas com outros elementos oriundos da investigação de seguimento não raramente conduzem até a pessoa mais cautelosa a equívocos.

Adotando-se um modelo de audiência de custódia, é inevitável que o julgador cristalize um juízo acerca da conduta do preso com base exclusivamente naqueles elementos colhidos precariamente, sem contraponto ou cotejo com outros que confirmem ou não as conjecturas iniciais da prisão, gerando um convencimento embasado em indícios de autoria e materialidade muitas vezes frágeis, que inevitavelmente acompanharão o magistrado até a sentença.

Esse juízo de valor sobre os fatos brutos por parte do juiz representa um retrocesso grave em termos de garantias individuais e mácula sobre os pressupostos de isenção e imparcialidade do julgador, valores inexoráveis do sistema acusatório, ao lado da separação das funções de investigar, acusar e julgar.

Daí a importante da função do delegado de polícia, que se assemelha àquela exercida pelo juiz de instrução, visto que evita essa “contaminação” do juiz julgador.

Nesse diapasão, quem conhece a sistemática procedimental da prisão em flagrante, sabe que o delegado de polícia não é mero homologador de prisões, porquanto faz a análise dasituação sob os aspectos fáticos e jurídicos, não estando obrigado a homologar prisões ilegais ou que não estejam em situação flagrancial.

Por outro lado, uma lei obrigando a apresentação de todos os presos perante o Poder Judiciário exigiria a organização de volumosas pautas de audiência com juiz, Ministério Público e Defensoria Pública diariamente, e não apenas nos dias úteis durante o horário de expediente, sob pena de marcante incoerência.

Se pensarmos nos milhares de municípios existentes no Brasil, aproposta de audiência de custódia se mostra totalmente impraticável, visto que em sua grande maioria conta apenas com um delegado de polícia, sendo esta muitas vezes a única autoridade a menos de 200 km de distância que, por dever de ofício, vai até onde se encontra o cidadão detido para analisar a legalidade de sua prisão, postura que dificilmente se verá por parte de uma comissão de audiência de custódia, visto que hoje nem mesmo um defensor público é disponibilizado para acompanhar um simples auto de prisão em flagrante.

Não é preciso grande esforço para perceber que uma lei com tais imposições não seria observada, criando mais uma causa de nulidade processual da prisão, que resultaria inevitavelmente no relaxamento de prisões em massa, trazendo intranquilidade social e depreciação à imagem do Poder Judiciário.

Não se olvida, ainda, que a audiência de custódia aumentaria os gastos públicos na área de segurança pública, onde os recursos são notoriamente escassos, exigindo a contratação de grandes efetivos policiais ou, o que é mais provável, o desvio dos poucos policiais para atividades alheias às suas funções, como o transporte e a custódia de presos.

Para os magistrados e auxiliares da Justiça não seriam insignificantes os riscos pessoais, porquanto se veriam em meio a inúmeros presos, fazendo de Fóruns verdadeiras cadeias transitórias, diante do tráfego de presos para realização de audiências de custódia, podendo ensejar tentativas de resgates violentos, notadamente em casos de integrantes de organizaçõescriminosas, o que, por consequência, exigiria mais segurança, mais recursos e contratações, onerando ainda mais os contribuintes.

Portanto, buscando conciliar os ditames constitucionais e dos tratados de direitos humanos ao sistema processual penal brasileiro, a fim de extirpar qualquer possibilidade de violações à incolumidade do preso ficarem impunes, apresentamos o presente projeto, que objetiva promover as seguintes medidas:

1) Garantir a efetiva participação da defesa técnica no interrogatório policial ede que todos os presos sejam submetidos a exame de corpo de delito;

2) A vedação à custódia de presos em delegacias por prazo superior a 72 horas, visto que tal situação, ainda persistente no Brasil, representa uma situação degradante violadora dos direitos humanos previstos em tratados internacionais, pois o preso não exerce direitos básicos previstos na Lei de Execução Penal;

3) Possibilidade de o delegado de polícia aplicar algumas medidas cautelares não sujeitas à reserva de jurisdição, servindo como alternativa à manutenção de prisões desnecessárias por crimes leves;

4) O estabelecimento da audiência de custódia no prazo de 24 horas, após o recebimento do auto de prisão em flagrante, para preso em flagrante que não tenha sido colocado em liberdade previamente, com fiança ou outra medida cautelar diversa da prisão.

Firme no propósito de colaborar no aperfeiçoamento do ordenamento jurídico e apresentar soluções razoáveis e eficazes, ofertamos o presente projeto, que temos a certeza significará um avanço notório na proteção aos direitos humanos.

Sala das sessões, 24de fevereiro de 2015.

LAERTE BESSA

Deputado Federal

Publicado em 15/12/2015

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